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As bets chegam ao futebol de várzea

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Início das Bets

A crescente influência das plataformas de apostas esportivas no Brasil tem gerado preocupações significativas, especialmente no contexto do futebol de várzea, que historicamente representa um espaço de lazer e inclusão social.

 

Recentemente, o deputado Simão Pedro (PT-SP) apresentou o PL 651/2024, com o intuito de proibir a publicidade e comunicação mercadológica de sites e aplicativos de apostas no estado de São Paulo. Essa medida visa controlar as consequências sociais e de saúde pública de uma epidemia de vício em apostas que se alastra pelo país. O projeto inclui a criação de campanhas de conscientização, focadas principalmente no público jovem, que é mais suscetível ao apelo das interações digitais. Para viabilizar essa iniciativa, o estado propõe mecanismos de arrecadação sobre as plataformas de apostas, visando financiar ações de saúde, prevenção e tratamento dos viciados.

Medidas semelhantes estão sendo propostas em nível federal por parlamentares como a deputada Gleisi Hoffman e o deputado Reginaldo Lopes, ambos do PT.

 

Em entrevista ao programa TV GGN 20 Horas, Simão Pedro revelou que seu interesse em abordar a questão surgiu após a trágica descoberta de que dois colegas de um parceiro de futebol haviam tirado a própria vida devido a dívidas relacionadas a apostas. Ele destacou que, preocupantemente, até os times de várzea estão sendo cooptados por essas plataformas, que já patrocinam alguns uniformes, evidenciando a necessidade urgente de um debate sobre os riscos e as consequências dessa relação.

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Os caminhos da regulamentação tardia

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Manipulação de Resultados

O presidente Lula sancionou, com vetos, a lei 14.790/23, conhecida como "lei das Bets", publicada no Diário Oficial da União em 30 de dezembro de 2023. Essa nova legislação regulamenta as apostas esportivas no país, estabelecendo tributações, critérios de exploração, sanções e atribuições ao Ministério da Fazenda.

 

A lei abrange apostas virtuais, físicas, eventos esportivos reais e jogos online. Ela define critérios de tributação, requisitos para a exploração do serviço e a destinação das receitas arrecadadas. Além disso, determina sanções em caso de descumprimento e estabelece as competências do Ministério da Fazenda na regulamentação, autorização, monitoramento e fiscalização das atividades relacionadas ao mercado de apostas de quota fixa.

 

Após a dedução dos valores destinados ao pagamento de prêmios e ao imposto de renda do apostador, até 88% do saldo será utilizado para cobrir despesas de custeio e manutenção dos operadores de jogos de apostas. Os 12% restantes serão alocados a diversas áreas do governo, incluindo o Ministério da Educação, Turismo e Saúde.

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Diante de uma epidemia de apostas esportivas, o governo brasileiro aposta na regulamentação e taxação das plataformas. Charge: Lola Guerra.

A regulamentação, agora em vigor, prevê que as empresas que desejam operar no Brasil precisam se cadastrar, passando por um crivo do Ministério da Fazenda e pagando R$ 30 milhões por uma licença de cinco anos, o que contribuirá para a arrecadação do governo.

 

As empresas autorizadas devem recolher 12% de tudo o que recebem em apostas em forma de impostos. Os apostadores contemplados, por sua vez, terão que pagar 15% de imposto de renda sobre os prêmios ganhos.

O texto da lei também prevê a distribuição dos recursos arrecadados de acordo com o tipo de loteria (federal, esportiva, de prognósticos). As estimativas do governo federal indicam que essa distribuição poderá gerar R$ 1 bilhão para a segurança pública, R$ 630 milhões para o esporte e R$ 412 milhões para a cultura.

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O legado de omissões quanto às regulações das apostas

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O crescimento descontrolado do mercado de apostas no Brasil está intimamente ligado à omissão do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), que, durante seu governo, deveria ter regulado essa atividade, estabelecendo regras e limites. No entanto, Bolsonaro não tomou as medidas necessárias, permitindo que as apostas se expandissem vertiginosamente sem a devida supervisão governamental.

 

A questão da regulamentação das apostas ganhou destaque com a sanção da Lei 13.756, publicada em 13 de dezembro de 2018. Essa legislação foi originada de uma antiga Medida Provisória (MP) assinada pelo ex-presidente Michel Temer, que buscava destinar recursos das loterias para o esporte nacional. O Congresso, no entanto, modificou a proposta para legalizar as apostas esportivas. A lei estipulou que o governo teria dois anos para regulamentar os artigos da legislação, com a possibilidade de prorrogação por mais dois anos, estendendo o prazo até dezembro de 2022.

 

Vale ressaltar que a MP aprovada limitava-se às apostas esportivas, mantendo a proibição de jogos de azar, como caça-níqueis, bingos, roleta e blackjack, tanto em estabelecimentos físicos quanto em sites online hospedados fora do Brasil.

 

Com a sanção da MP por Michel Temer, as apostas de quota fixa — popularmente conhecidas como apostas esportivas — foram legalizadas no Brasil. A decisão foi anunciada em uma cerimônia no salão nobre do Palácio do Planalto, acompanhada por diversos ministros, incluindo Sérgio Sá Leitão (Cultura), Raul Jungmann (Segurança Pública), Gustavo Rocha (Direitos Humanos), Joaquim Silva e Luna (Defesa) e Leandro Cruz (Esportes). Durante o evento, o Ministro Leandro Cruz destacou que o Fundo Nacional de Segurança Pública terá um papel crucial na transformação da segurança no país, sem desconsiderar outras áreas essenciais como esporte e cultura. Segundo ele, essa seria uma conquista significativa para todo o Brasil.

 

A falta de regulamentação durante o governo Bolsonaro deixou um vácuo que permitiu a expansão desordenada das apostas, refletindo a necessidade urgente de um marco regulatório eficaz para garantir a integridade e a segurança do setor.

 

As bets chegam ao futebol de várzea

“É difícil você achar num grupo de 10 pessoas, duas ou três que não apostem”, afirmou Caio Flores, técnico do time de várzea Chão de Várzea, “mas tem muita gente que aposta mesmo que vai perder”. Flores alega conhecer somente pessoas que apostam valores pequenos e que não comprometam o orçamento familiar.

 

“O Brasil é o paraíso para eles [sites de apostas esportivas]. Nasce e vive futebol o tempo todo”, afirmou o técnico ao apontar que grande parte da população do país se considera detentora de grande conhecimento sobre o esporte. Inclusive, Fores acredita que uma parcela considerável dos apostadores já tenha deixado de jogar devido às decepções causadas pela dificuldade em obter grandes ganhos ou até mesmo transformar a jogatina em uma renda extra. “Hoje, eu posso te falar que até menos que uns dois anos atrás. Hoje, diminuiu porque não é essa ilusão toda”, ressalta.

 

O técnico revela a participação de casas de apostas no patrocínio de times de várzea e enquanto organizadores de campeonatos. “ Se times grandes como Corinthians, Fortaleza tudo já tá aceitando casa de aposta imagina time de várzea que quase não tem dinheiro”, afirma Caio Flores. Ele explica que os principais times da categoria vem investindo em contratar ex-profissionais e que equipes como o Jardim Verônia, localizado na zona leste de São Paulo, paga a seus atletas em torno de R$ 500 por partida.

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Casa de apostas F.12 possui várias iniciativas relacionadas ao futebol de várzea. Foto: Reprodução/ redes sociais.

Casa de apostas F.12 possui várias iniciativas relacionadas ao futebol de várzea. Foto: Reprodução/ redes sociais.

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Casa de apostas F.12 possui várias iniciativas relacionadas ao futebol de várzea. Foto: Reprodução/ redes sociais.

Ou seja, o patrocínio de uma grande casa de apostas poderia facilitar a estruturação do time e garantir destaque para sua atuação. “Fazer um time crescer traz visibilidade”, diz o técnico que revelar ser mais rentável para uma equipe manter-se enquanto um dos melhores do futebol de várzea do que transicionar para a série C. De acordo com Flores, o futebol de várzea consegue girar um grande montante a partir de seus melhores times.

 

Quanto aos campeonatos, Flores compartilha a experiência vivida durante o Campeonato de São Lourenço de 2022, realizado pela prefeitura da cidade de mesmo nome, que fica na região metropolitana da capital paulista, e patrocinada por uma plataforma de apostas esportivas. Ainda que não se recorde de qual casa de aposta tenha sido, Flores lembra que a inscrição para o torneio teria sido o cadastro de, ao menos, dois membros da equipe na plataforma. Considerando que os valores das inscrições oscilam entre R$ 300 e R$ 1000, a efetivação de dois depósitos de R$ 100 significaria uma economia.

 

Caio Flores elogiou a organização do evento que, segundo ele, “não tinha tanta bagunça quanto nos anos anteriores”. Nesses casos, os torneios ocorreriam de forma mais organizada, resultando em poucos atrasos, melhor estado dos gramados, apesar de manter os problemas de arbitragem. Até o fechamento desta reportagem, a Prefeitura de São Lourenço não se manifestou para confirmar a casa de apostas patrocinadora do campeonato.

 

Quando perguntado sobre a possibilidade de se apostar em partidas do futebol de várzea através das plataformas, Flores desacredita que possa acontecer devido às suspeitas sobre manipulação de resultados que possam surgir. “Se tiver alguma descoberta de interferência direta deles [das plataformas de apostas], acabou a credibilidade do cara”, destacou o técnico. Uma vez que não existe uma órgão fiscalizador da categoria de várzea, tarefa que recai inteiramente sobre os organizadores de cada evento, Flores aponta que as plataformas teriam que comprar os direitos do campeonato e obter a homologação para poder oferecer apostas para a categoria. Ele ainda exemplifica com a Copa Pioneer, um dos maiores campeonatos de várzea do mundo. “Já tem influência sem bets, imagina com bets dentro deles, legalizado, fazer aposta dentro do jogo da várzea. Aí eles perdem todo o crédito”, se queixa o técnico que afirma que “o cara não vai se sujeitar a colocar o time dele na bet por causa disso”.

 

Questionado sobre o principal retorno conseguido pelas casas de apostas ao investir em grandes campeonatos da categoria de várzea, Flores é categórico: “divulgação, né?”. “Já ouviu aquela história ‘quem é visto sempre é lembrado?’ É isso que eles fazem. Eles tentam estar em todos os lugares possíveis”, completa o técnico que ilustra a situação: “o cara tá lá jogando [e pensa] ‘quero apostar!’... Tá lá na camiseta de alguém no campeonato, o cara vai lá e baixa o aplicativo que tá na frente dele”.

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Relação da F12 com o futebol de várzea

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Regulamentação

Quem é a F12?

 

A F12 se define em seu site como “uma casa de apostas que investe no futebol de várzea. Por isso, é possível acompanhar os campeonatos de várzea na F12.bet”. Entre as opções de entretenimento oferecidas pela plataforma, a F12.bet “vem com algumas novidades como uma melhor diversidade nos jogos crash, além de um cardápio imenso de cassinos”. A plataforma oferece tanto promoções para apostas nesta categoria como dicas e palpites dos campeonatos através do F12 Tips, o blog com conteúdo esportivo da empresa.

 

A F12 Entertainment é composta por quatro frentes: a F12.bet, que é a casa de apostas em si, a F12.Fans, onde a comunidade pode "palpitar de foma gratuita nos principais jogos e campeonatos do Brasil e do mundo", a F12Partners.club, que é um programa de afiliados gratuito, oferecendo material de suporte, acompanhamento diário dos resultados, marketing criativos e links rastreáveis e a F12.Tv, o canal de vídeos com conteúdos exclusivos do ex-jogador de futsal Falcão.

 

Através do perfil @f12navarzea, a empresa divulga suas iniciativas do futebol de várzea. Sob o título "a casa das maiores Copas", apenas a conta do Instagram já alcançou mais de 87 mil seguidores.

 

De acordo com  matéria da GamesBras, Falcão lançou o time de várzea Reinaldo Futebol Clube em março deste ano. A estreia da equipe aconteceu no campo CDC Magnólia, no bairro da Vila Maria, em SP, pela Copa Nove de Julho. O campeonato era patrocinado pela F12 assim como a Super Copa Pioneer, Copa da Paz, Copa do Busão, Copa Anhanguera, Copa Macaco Louco, Negritude, Savime, Doroteia, Regina e Xdmorro.

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Equipe do futebol de várzea se apresenta com uniforme patrocinado pela F.12 durante a Copa Savime, também bancada pela plataforma. Foto: Reprodução/Youtube.

Lançada em maio de 2023, a Escola de Futebol F12 visa lapidar jovens talentos do esporte treino especializado, unindo a evolução individual do atleta à integração coletiva.

 

O técnico Edson Pepê ainda trabalhava no Atlético Paranaense quando idealizou o projeto, dando origem ao "Personal Soccer", metodologia desenvolvida por ele para aplicar um treino adequado para a realidade do atleta, além das ações comunitárias mensais realizadas em locais em que os jovens, geralmente, não podem investir em um trabalho diária de alto rendimento. Após patrocínio da F12, foi aberta a Escola de Futebol com base na metodologia de Pepê e a Arena 12, localizada no bairro da Várzea, na zona oeste de Recife, se tornou o lar do projeto.

 

Segundo reportagem da IGaming Brasil, a F12, Galera Bet e Betsson protocolaram pedidos de autorização junto à Secretaria de Prêmios e Apostas (SPA) para operar o mercado de apostas online de cotas fixa no Brasil, seguindo as portarias do Ministério da Fazenda.

 

Nesse contexto, outra matéria do Estadão revelou que uma onda de fusões e aquisições entre grandes bancas estaria ocorrendo antes do prazo estipulado pelo governo brasileiro para a regularização das casas de apostas em janeiro de 2025. A corrida é para ver quem responde pelos recebimentos e pagamentos das apostas, já que a lei brasileira autorizará apenas entidades com aval do Banco Central.

 

O brasileiro Ocean 88 Holding, dono da marca Galera.bet, teve 40% arrematado por uma das maiores fornecedoras de tecnologia para jogos online, a britânica Playtec, por US$ 5 milhões.

 

Por sua vez, tanto a F12 quanto a Inovabet, do influenciador Luva de Pedreiro, também foram compradas pela Playtec. Ambas operam no mercado pernambucano. Assim, a Playtec pode não apenas entrar nos mercados regionais como ampliar sua base de clientes.

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Quem é Quem.F12?

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Infográficos
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Aberta em 29 de janeiro de 2024, a Galera Gaming Participações, LTDA, nome oficial da Galera.bet, tornou-se sócia da F12 em 29 de julho do mesmo ano, cuja atividade registrada como “outras sociedades de participação, exceto holding”, é formada pelos seguintes nomes de acordo com seu CNPJ:

 

Alberto Picciotto Valt: aparece como administrador da Galera Gaming desde 10 de julho de 2024. No entanto, em seu perfil de LinkedIn, Valt se apresenta como ex-aluno de Estudos Judaicos da Yeshivat Hakotel e estagiário desde 2022 do Ministério de Relações Exteriores de Israel, em Jerusalém, e da Galera.bet, desde 2023.

 

Marco Antonio Dominici Paes: o advogado aparece como sócio-administrador e é representante da empresa.

Marcos Paulo de Sousa Sabiá aparece como CEO da Galera.bet e representa Nissim Joshua Hassett, sócio pessoa física residente no exterior e diretor da Match Time Europe Solutions LTDA.

 

Maria Fernanda Seiroz aparece como sócia da F12 desde 29 de julho de 2024. Em seu LinkedIn, Maria aparece como ex-aluna da Universidade de Aveiro e atual diretora de Customer Service da F12 e fundadora e CEO da Bet Assist (@betassist), cujo CNPJ foi registrado no mesmo endereço da F12 em Recife.

 

Paula Braytne Nunes Fernandes, que aparece como sócia da F12, consta como chefe  de Compliance da Ocean 88 Holding, empresa fundada em 27 de julho de 2020 e domiciliada no Chipre.

 

João Marcelo Costa Monteiro de Moraes (não encontrado)

 

Galera.bet: operada pela Match Time Solutions B.V, em Curaçao, mas quem fornece serviços de gestão de pagamentos é sua subsidiária Match Time Solutions Europe Limited, registrada em Lanarca, no Chipre.

 

Apesar de que o nome do ex-jogador de futsal, Alessandro Rosa Vieira, mais conhecido como Falcão, não constar como sócio ou administrador da F12, no site da plataforma de que "no primeiro trimestre de 2022, ele [Falcão] está lançando a F12 Entertainment, com sede no Brasil e em Portugal. A empresa chega ao mercado com soluções inovadoras para o entretenimento digital e promete ser uma holding em ascensão". Já no "Quem Somos", Falcão é chamado de "rei do futsal e embaixador da F12.bet".

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Imagem do endereço disponibilizado no site da F12 como escritório em Portugal segundo o GoogleMaps.

De acordo com o site da F12.bet, o serviço de apostas esportivas e cassino é fornecido pela F12 Gaming NV domiciliada em Curaçao e autorizada pelo governo daquele país o que, segundo a empresa, “significa que possuímos os mais altos padrões de regulação”. Quanto ao processamento de pagamentos via Pay Safe Group, a responsável seria a F12 Entertainment Ltd registada no mesmo endereço que a Match Time Europe Solutions, no Chipre. 

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Imagem do endereço disponibilizado no site da F12 como escritório no Chipre segundo o GoogleMaps

Dessa forma, a F12 Gaming alega estar regida pelo Regulamento de Jogos Remotos estabelecidos pelo governo de Curaçao, que emitiu sua licença. Portanto, seria “obrigada a adotar medidas adequadas para impedir que seus sistemas sejam usados para fins de lavage de dinheiro financiamento do terrorismo ou qualquer outra atividade criminosa”. Entre as determinações está o estabelecimento de um Diretor de Relatórios de Lavagem de Dinheiro (Money Laundering Reporting Officer em inglês). Todos os casos de suspeita de tentativa de lavagem de dinheiro devem ser registrados em relatório pelo diretor e assessorado pela autoridade legal onde a transação ocorreu, além de preservar os registros necessários. Uma lista de clientes identificados como de “alto risco ou politicamente exposto” para serem verificadas com maior frequência.

 

Procurados pela reportagem, os responsáveis pela F12 e Galera.Bet não foram encontrados, portanto deixamos o espaço aberto para futuras manifestações.

Quem é o apostador brasileiro?

 

Segundo estudo realizado pelo Banco Central a pedido do senador Omar Aziz (PSD-AM), cerca de 24 milhões de pessoas realizaram, ao menos, uma transferência via Pix para plataformas de apostas e jogos de azar até agosto de 2024; dentre elas, 5 milhões de pessoas são eram beneficiárias do Programa Bolsa Família.

 

O perfil do apostador médio no Brasil tem entre 20 e 30 anos e quanto mais velho, maiores são as quantias apostadas: enquanto os mais jovens perdem em torno de R$ 3.000 mensais. O levantamento definiu as “famílias de baixa renda como as mais prejudicadas pela atividade das apostas esportivas”.

 

https://www.bcb.gov.br/conteudo/relatorioinflacao/EstudosEspeciais/EE119_Analise_tecnica_sobre_o_mercado_de_apostas_online_no_Brasil_e_o_perfil_dos_apostadores.pdf

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Os impactos psicológicos na vida de quem aposta

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Depoimentos

A ludopatia é reconhecida pela Organização Mundial da Saúde (OMS) como transtorno mental capaz de influenciar negativamente os indivíduos no aumento de casos de depressão e ansiedade, endividamento, desemprego, alcoolismo, violência doméstica e suicídio. Ao menos dois CIDs estão relacionados à essa compulsão: o CID 10Z72.6 (mania de jogo e apostas) e o CID 10F630 (jogo patológico).

 

História de apostadores compulsivos inundam os telejornais nos últimos anos no Brasil. Nossa reportagem ouviu um apostador que se define como casual e dois apostadores compulsivos que já estão em processo de recuperação. 

Iniciamos com a história de Paolo*:

Desde que iniciou a apostar, há cerca de 2 anos, Domenico* considera que sua experiência foi positiva e se define como "um apostador saudável". A plataforma escolhida por ele é a britânica Bet365 que, segundo Domenico, está entre as mais antigas e é vista como "confiável", ou seja, "não vai desaparecer com meu dinheiro".

 

As modalidade escolhidas por ele são futebol e MMA por serem dois esportes com os quais está familiarizado. "Me dá a sensação de que eu tenho alguma base para fazer aquela aposta", afirma.

 

No entanto, para Paolo, que é economista e atua como gestor de fundos de investimento, o conhecimento prévio da modalidade em que se aposta é "indiferente" quando a brincadeira se torna compulsão. "De qualquer forma é um ciclo e o final é a perda, independente se eu sei jogar ou não", declarou o participante da Jogadores Anônimos. Ele menciona que chegou a apostar em esportes distantes de sua realidade, como o tênis de mesa asiático, alegando que "no fundo, eu não jogava pelo dinheiro, pelo prazer ou pelo entretenimento, eu jogava pela dopamina".

 

Uma vez que a Bet 365 aceita depósito mínimo, Domenico aposta dentro desse valor, totalizando 30 reais. "Se eu fizer uma aposta, é uma aposta de 30, se eu fizer duas, vou fazer duas de 15, se eu fizer 3, serão três de 10", explica.

 

Outra forma de se proteger é não deixar dinheiro na plataforma, sempre resgatando; em caso de ganhos, Domenico realiza o saque imediatamente. "Perco muito pouco; quase sempre perco, mas é pouco dinheiro", afirma o apostador cujo último extrato que emitiu da plataforma indicava um 'zero a zero' entre perdas e ganhos.

 

Por outro lado, Domenico revela que já teve seus dias de sorte. "Eu já ganhei apostas muito boas", relembra ao mencionar um palpite de 30 reais que resultou no ganho de 1900 reais, outra em que apostou 100 e conseguiu 800 reais. "Então, se meu extrato está no 'zero a zero' é sinal de que eu já perdi muitas apostas", diz Domenico, que enfatiza jogar pela diversão já que o ganho "é muito difícil".

 

Andreas começou a jogar offline há 19 anos, quando foi ensinado a jogar poker em uma noite de pizza com amigos. Sua jornada pelos jogos de azar o levou para diversas partes, como cassinos, craps, blackjack e se intensificou na era digital, com a possibilidade de apostar nas bets, poker online, daytrade. Segundo Andreas, a compulsão o levou a apostar “até qual elevador chegava antes ou qual cor carro passava antes na porta de um hotel quando passeando, coisa de maluco”, diz.

 

Ao longo de duas décadas, Andreas* sofreu com as consequências do jogo e das apostas esportivas tanto no aspecto financeiro quanto no pessoal. Enquanto recorria a empréstimos e a dilapidar seu próprio patrimônio, o ex-jogador se afastava de seus círculos sociais para alimentar o vício. “Não existe mais rotina, a vida gira em torno de apostar, salvo quando dormindo”, explica ao reforçar que estava entrando em “depressão sem perceber”, preferindo se isolar para continuar jogando.

 

Para nossa reportagem, Andreas conta a ocasião em que, durante uma madrugada, conseguiu ganhar R$ 130.000 em apenas 4 horas de poker online. Entretanto, ele não saiu do jogo e perdeu R$ 300.000 em 15 minutos. Assim como Paolo, Andreas enfatiza que a sensação de risco e a expectativa da vitória são fatores determinantes para o comportamento impulsivo dos apostadores.

 

O início do auge das apostas esportivas online aconteceu durante seu processo de recuperação. “Ainda bem, senão

tinha ido ainda mais ao fundo do poço ou nem estaria aqui para lhe responder”, afirma Andreas.

 

“Se soubesse que era doente, eu teria procurado ajuda de apostar”, revela Andreas que encontrou uma saída para o problema em 2021, quando conheceu a Jogadores Anônimos. Foram 10 anos vivendo na espiral do jogo, que o levou a perder todo seu patrimônio e pensar em tirar a própria vida, mas que, graças ao “apoio incondicional da minha esposa aguentando esse inferno e me levando em busca de resolver” que Andreas conseguiu se recuperar.

 

“O problema é que essa doença da compulsão por jogo é silenciosa, é emocional, e não demonstramos até estarmos derrotados em nocaute na lona”, alerta o ex-jogador, que está há quatro anos longe de jogos de azar. Ele afirma que descobrir que o jogo patológico era uma doença facilitou o processo de frear seus próprios impulsos e voltar a ter controle sobre si mesmo. “Sei que sou um jogador compulsivo e que minha vida se transformou num caos, ficou ingovernável, então eu não posso nem imaginar em fazer qualquer tipo de aposta; só por hoje, amanhã começa o mesmo ciclo e assim por diante”, alerta Andreas.

 

Aos moldes dos Alcoólicos Anônimos, a Jogadores Anônimos é um grupo de apoio que se baseia nos 12 passos para promover a recuperação de jogadores compulsivos. Tanto ele quanto Paolo participam das reuniões promovidas pelo grupo e têm alcançado bons resultados na recuperação da compulsão. Todos os nomes dos apostadores entrevistados foram mudados com o fim de proteger suas identidades.

 

Surgida no final dos anos 50 na cidade de Los Angeles, na Califórnia (EUA), a Jogadores Anônimos realizou sua primeira reunião no Brasil em 23 de março de 1993. O serviço é prestado de maneira gratuita e o único requisito para participar é o desejo de parar de jogar. Quanto ao seu funcionamento, a irmandade não oferece atendimentos multidisciplinares como jurídico e psiquiátrico, além de não se posicionar sobre nenhum tema.

 

Para ela, a adicção ou compulsão é “uma doença progressiva, incurável, mas que pode ser detida” através do apoio mútuo. “Só por hoje, um dia de cada vez” é o lema utilizado pelos participantes da "Jogadores Anônimos”.

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© 2024 por Victor Dias.

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